A rivalidade entre Ford e Chevrolet ganhou novos capítulos em Nürburgring, circuito alemão considerado o mais desafiador do mundo. Conhecido como “inferno verde”, o traçado de 20,8 km reúne 73 curvas e mudanças bruscas de elevação, funcionando como laboratório para fabricantes que buscam validar desempenho, durabilidade e segurança em condições extremas. Ali, tempos de volta não são apenas números: são instrumentos de marketing e símbolos de supremacia tecnológica.
“Manter essa disputa entre Mustang e Corvette, Ford e Chevrolet, é essencial para o mercado”, disse Alan Corrêa, especialista em automóveis do Carro.Blog.Br. “Essas rivalidades históricas não são apenas corridas contra o relógio, mas funcionam como motores de inovação. Quando uma marca quebra um recorde em Nürburgring, a outra é obrigada a responder, e isso gera avanços técnicos que acabam beneficiando toda a indústria.”
O primeiro grande golpe veio da Ford, com o lançamento do Mustang GTD. A versão mais radical do cupê, equipada com motor V8 5.2 supercharged de 815 cavalos, câmbio transaxle de oito marchas na traseira e aerodinâmica ativa, foi projetada em parceria com a Multimatic, responsável também pelos protótipos de corrida da marca. Em agosto de 2024, guiado pelo alemão Dirk Müller, o GTD tornou-se o primeiro carro americano de produção a quebrar a barreira dos sete minutos, registrando 6min57s685. Meses depois, em maio de 2025, Müller retornou com o modelo ajustado e baixou o tempo para 6min52s072, consolidando o Mustang entre os quatro veículos de produção mais rápidos já registrados em Nürburgring.
A Chevrolet respondeu em agosto de 2025 com uma dupla de impacto. O Corvette ZR1, movido por um V8 LT7 biturbo de 1064 cavalos, cravou 6min50s763. Mas foi o ZR1X, versão híbrida equipada com motor a combustão e tração elétrica no eixo dianteiro, que roubou a cena. Combinando 1250 cv e um sistema de tração integral eletrificado (eAWD), o esportivo alcançou 6min49s275, superando o Mustang GTD e se tornando o carro americano de produção mais rápido no circuito. Nas redes sociais, a Chevrolet aproveitou o momento para provocar a rival, ao que o CEO da Ford, Jim Farley, respondeu afirmando que “o jogo tinha começado”.
“Além do aspecto tecnológico, há também o impacto no consumidor”, completou Corrêa. “Modelos como Mustang GTD ou Corvette ZR1X servem como vitrine de engenharia. Mesmo que poucos tenham acesso direto a esses carros, as tecnologias desenvolvidas neles acabam sendo adaptadas para veículos de produção mais acessíveis, melhorando segurança, performance e eficiência.”, explicou.
“É por isso que manter viva essa rivalidade é tão importante”, concluiu o especialista. “Ela mantém a indústria em movimento, cria desejo, fortalece a identidade das marcas e ainda estimula a concorrência global. No final, não são apenas Ford e Chevrolet que ganham, mas o mercado automotivo como um todo.”, resumiu Alan.
A tréplica veio de forma inesperada. A Ford colocou em pista a SuperVan 4.2, uma van elétrica baseada na Transit, mas transformada em protótipo de competição. Com quatro motores elétricos que juntos entregam 2000 cavalos, a máquina foi conduzida por Romain Dumas, piloto recordista em Pikes Peak. O resultado foi impressionante: 6min48s393, tempo suficiente para superar os dois Corvettes e colocar uma van no rol dos dez veículos mais rápidos da história de Nürburgring. A marca aproveitou para homenagear a alemã Sabine Schmitz, ícone da pista, que nos anos 1990 popularizou a façanha de guiar uma van em alta velocidade no mesmo circuito.
“Colocar a SuperVan 4.2 em Nürburgring foi um golpe de mestre da Ford”, disse Alan Corrêa, especialista do Carro.Blog.Br. “Ninguém esperava que uma van pudesse superar superesportivos tradicionais. Essa jogada foi genial porque quebrou a lógica do mercado e mostrou o potencial da eletrificação. Além disso, o impacto de marketing foi gigantesco: transformar uma Transit em um monstro de 2.000 cavalos capaz de vencer um Corvette é o tipo de narrativa que viraliza e reforça a imagem de inovação da marca. É um exemplo claro de como ousadia técnica e estratégia de comunicação podem andar juntas.”
O impacto dessa disputa vai além das pistas. Nos Estados Unidos, a Chevrolet confirmou o Corvette ZR1 a partir de 173 mil dólares, enquanto o ZR1X híbrido, previsto para 2026, deverá custar mais caro e reposicionar a marca no segmento de hipercarros eletrificados. O Mustang GTD, ainda não disponível ao público, tem estimativa de preço em torno de 300 mil dólares e produção limitada, reforçando sua vocação de halo car. No Brasil, a diferença é ainda mais marcante: o Camaro saiu de linha em 2024, enquanto o Mustang segue em alta. Em 2024, foram 704 unidades vendidas, e no primeiro semestre de 2025 já haviam sido emplacadas 579, segundo a própria Ford. As 200 unidades da versão manual, vendidas a R$ 600 mil, esgotaram em apenas uma hora. Em agosto, a marca lançou no país o Mustang Dark Horse, de 507 cv, por R$ 649.900, ampliando a oferta e reforçando a liderança no segmento de esportivos.
A escolha de Nürburgring como campo de batalha não é casual. O circuito é referência global para validação de performance porque combina longas retas com curvas de baixa velocidade, trechos ondulados e áreas de frenagem extrema. Por isso, além de medir aceleração e potência, os testes revelam a eficácia da suspensão, a resistência dos freios e a capacidade de manter estabilidade em condições críticas. É também uma arena pública: os tempos são auditados e se tornam parte da história, o que explica por que marcas utilizam o resultado como argumento de vendas. O caso do Mustang e do Corvette mostra como a narrativa de rivalidade pode ser explorada em campanhas globais.
O duelo também evidencia as diferentes estratégias das duas fabricantes. Enquanto a Ford aposta no Mustang GTD como vitrine de engenharia aplicada a um ícone popular, a Chevrolet utiliza o Corvette ZR1X para mostrar que a eletrificação não está restrita a SUVs ou modelos de luxo, mas também pode redefinir o conceito de hiperesportivo americano. Já a SuperVan 4.2 reforça o papel da Ford como inovadora, levando um conceito experimental às pistas e mostrando como a transição para elétricos pode, paradoxalmente, gerar ainda mais potência.