Em teoria, a Internet é perfeita para crianças: permite-lhes aprender, explorar os seus gostos, expressar a sua personalidade, e dar algum descanso aos pais. Contudo, existem muitos riscos associados ao uso de telemóveis, computadores, e tablets com ligação à Internet por parte de crianças.
Num momento em que mais de 90% das crianças portuguesas usam telemóvel, negar-lhes totalmente o acesso à Internet não parece ser uma solução plausível para combater os perigos do mundo online. Então, o que podem pais e educadores fazer? Para chegarmos a algum tipo de conclusão, precisamos primeiro de perceber quão perigosa é a Internet em concreto.
Canal de YouTube “secreto” de crianças causa problemas graves à mãe
Recentemente, o New York Times publicou um artigo (em inglês) em que partilhou o caso de Jennifer Watkins, uma mãe australiana que perdeu o acesso total à sua conta Google (incluindo logins bancários e e-mail de trabalho) e ficou em risco de ser investigada pela polícia simplesmente porque deixava os seus filhos usar o seu tablet à vontade.
Sem o conhecimento da mãe, as duas crianças geriam um canal de YouTube onde publicavam conteúdo original. O canal incluía vários vídeos das crianças a dançar, mas acabou por ser identificado pelos algoritmos de segurança da Google após a publicação de um vídeo em específico. O motivo? Possível exploração infantil.
De um dia para o outro, Jennifer Watkins perdeu acesso à totalidade da sua conta Google e viu-se em risco de ser investigada pelas autoridades australianas pura e simplesmente porque um dos seus filhos publicou um vídeo a dançar com o rabo à mostra (o vídeo foi a resposta a um desafio feito por um colega de escola). Naturalmente, o conteúdo foi removido por possivelmente conter pornografia infantil, dando origem a uma série de processos que colocaram Watkins em graves problemas.
Perdas financeiras, reputação manchada, e outros problemas das crianças na Internet
Infelizmente, a história de Jennifer Watkins não se trata de um caso isolado. Desde que crianças de todo o mundo começaram a crescer com o telemóvel nas mãos, são vários os casos problemáticos.
Um dos mais célebres foi partilhado por jornais, revistas, e sites de notícias de todo o mundo por ser igualmente cómico e trágico. Aconteceu nos Estados Unidos, em Detroit, quando uma criança de seis anos utilizou o telemóvel do pai para encomendar cerca de mil dólares em comida através da aplicação Grubhub. A criança tinha inicialmente pedido o telemóvel ao pai, que acabou por adormecer, para jogar um jogo.
Esta situação caricata resultou em perdas financeiras relativamente baixas, mas poderia ter sido muito pior. Com tantas aplicações associadas a cartões de crédito e contas bancárias, uma criança mal intencionada poderia ter gasto muito mais dinheiro num curto espaço de tempo!
Contudo, perder dinheiro não é a única preocupação. Crianças na Internet, principalmente com acesso ao telemóvel de um dos pais, podem também prejudicar a reputação dos mesmos. Basta pensar no que aconteceria, por exemplo, se uma criança de cinco anos começasse a “brincar” com as redes sociais dos pais. Ter o LinkedIn, Instagram, ou Facebook hackeado é um autêntico pesadelo para muitas pessoas, que são amigas dos seus patrões, colegas de trabalho, ou potenciais empregadores.
Tudo isto é preocupante. Mas, para muitos especialistas, é apenas a ponta do icebergue. As maiores vítimas de crianças na Internet podem mesmo ser as próprias crianças em si; existem cada vez mais apologistas da ideia de que a exposição precoce de crianças à tecnologia pode ser extremamente negativa, não só em casa como na sala de aula.
Crianças na Internet: quais são os efeitos a longo prazo?
Na nossa sociedade, existe uma tendência para temer aquilo que é novo e diferente logo à partida; afinal, algo “desconhecido” é frequentemente confundido com algo “perigoso.” No caso das crianças na Internet, no entanto, existem demasiados riscos evidentes para colocar a questão de parte.
A lista de riscos online para crianças inclui cyberbullying, invasão de privacidade, roubo de identidade, e exposição a conteúdo para adultos. Todas estas questões podem acabar por ter efeitos negativos sérios na saúde mental das crianças; o cyberbullying, por exemplo, é recorrentemente associado ao risco de suicídio.
Mas os riscos não são apenas do foro da saúde mental: também existem questões físicas a ter em conta. Um estudo experimental realizado em 2022 concluiu que existe uma relação entre a exposição à luz dos telemóveis e o desenvolvimento de puberdade precoce. Previsivelmente, também existem vários estudos que indicam que a luz do telemóvel pode ser significativamente danosa para visão.
Nem oito… Nem oitenta!
Perante tantas preocupações, o que podem pais e educadores fazer? Para começar, é importante não entrar em pânico e proibir as crianças de utilizar aparelhos eletrónicos de todo! A solução deve ser essencialmente equilibrada: nem oito, nem oitenta.
Procure encontrar um equilíbrio entre o acesso online permitido aos seus filhos e a ideia de que qualquer aparelho com ligação à Internet é perigoso nas mãos de crianças. Ah, e não se esqueça: nunca deixe os seus filhos utilizar as suas contas, especialmente caso estas contenham informação privada, dados do seu trabalho, ou logins automáticos em contas bancárias.